Morte de um grande indivíduo

Fui convidado a assinar neste espaço uma crónica semanal. Aceitei o pedido com imenso e genuíno prazer, apesar de me parecer ter sido uma manobra para este não ser um blog de um autor só.
Como título, decidi hoje fazer uma homenagem a um homem que mordeu um dos meus, mas que teorizou como poucos sobre as fotografias que apresentam os colunistas nos jornais. Por ele aconselhado, decidi abandonar a minha imagem de Amigo Galhofeiro, substituindo-a por esta em que apareço mais sério.
Todavia, o tema de hoje é mesmo a morte, ainda que não de um grande indivíduo. Num destes dias fui passear aqui perto de casa e deparei-me, como de costume nesse local, com um enxame de pombas sedentas e prontas a ferrar. Não tenho por elas, e isso foi algo que aprendi, nenhum carinho ou estima. Mas naquele fim de tarde o meu canino coração amanteigou-se, qual queijo de ovelha serrano.
Uma delas preparava-se para levantar voo do parapeito de uma janela. Todas as suas companheiras saltaram para o ar e bateram as asas, aproximando-se velozmente das cabeças alvas ou calvas dos transeuntes. A primeira, no entanto, não foi capaz de voar. A sua pata ficou presa no metal de uma antiga persiana daquele prédio abandonado (e agora todo entaipado por tijolos). Pendurada de patas para o ar, esforçou-se para sair dali. Bateu as asas vigorosamente para se libertar. Ao fim de 20 minutos, parou. Parou para descansar um migalho, pois daí a pouco tempo voltou a tentar, em sucessivos últimos esforços...
Ao fim de 40 minutos, eu próprio deixei de acreditar. As outras agora pareciam abutres, incapazes de lhe prestar o mínimo auxílio. A 12 metros de altura, ninguém tinha capacidade de ir lá ajudá-la. Segui viagem...
Nessa noite, uma sensação de impotência tomou conta de mim, mas sei que não estive só. Com o despertador pronto para tocar à 1h, que a noite se adivinhava de intenso estudo, dormimos até às 5h30, abraçados apesar do calor estival que se sentia.